segunda-feira, janeiro 14, 2013

A Mão do Diabo - JRS

Foi recentemente que em tempo record fui capaz de acabar a mão do Diabo do José Rodrigues dos Santos.   Não é de ânimo leve que se começa a ler um livro daquele tamanho sabendo que o principal tópico será a crise e todos os motivos que nos levaram a este estado horrível das coisas. É na figura do Tomás Noronha e no seu estilo pseudo-aventureiro que o JRS nos descreve todos os passos que politicamente e economicamente nos fizeram caminhar para aquilo que ele refere como sendo a 2ª grande depressão. Durante toda esta descarga de informação ainda há tempo para algum mistério, um assassínio e algum romance. Felizmente, desta vez não houve nenhuma angolana-sueca para me fazer colocar as mãos na cabeça e tapar os olhos durante uma cena de sexo que pode ser descrita como algo capaz de arrancar gargalhadas à pessoa mais séria e desprovida de humor. Mas voltando ao cerne da questão, já que este é um texto acerca da crise vista por um dos autores portugueses mais lidos do séc XXI: a personagem do Tomás Noronha, este Robert Langdon versão portuguesa, explica-nos toda a conjuntura essencial. Desde a desregulação dos bancos de investimento e bancos comerciais, permitindo que os primeiros favoreçam os investimentos de risco tendo como base o dinheiro das pessoas trabalhadoras que fielmente depositam o seu dinheiro nas suas contas. Enquanto isto acontece os baixos juros de empréstimo e os baixos requisitos necessários para a contracção de empréstimos aumentam em muito os riscos que os bancos têm ao emprestar dinheiro! Associado a um conjunto de factores, na qual o principal é o rebentar da bolha imobiliária, temos um cocktail explosivo! Isto aconteceu nos USA, entretanto, na Europa, forma-se a União Europeia forma-se a zona Euro como a conhecemos hoje. Países como Portugal e Grécia entram nesta União, e protegidos por esta moeda forte pedem emprestado aos bancos com juros baixíssimos! A Grécia pecou pelas mentiras que disse para entrar na Zona Euro, Portugal, país em plena recuperação económica investiu em obras públicas com fundos europeus e dinheiro que não tinha! O resultado está à vista: quedas extraordinárias na produção de bens transaccionáveis e um grande número de PME's a fechar! Para que isto acontecesse o autor explica-nos muito bem como TODOS são culpados desta crise. Vá, todos é exagerar, as pessoas trabalhadoras que em nada se relacionam com política não podem ser culpados! Pessoas que votam, mas que nem assim se lhes pode apontar o dedo, já que o que acontece é corrupção pura e dura! Vou elaborar: é um ponto crítico e fundamental deste livro sabermos que o sistema político português, como muitos por esse mundo fora, se baseia em partidos. Estes partidos recebem os seus fundos de privados, algum do estado, mas principalmente de pessoas ou colectivos interessados em algo, portanto, com agenda política, não dando o dinheiro sem algo em contrapartida. Por um lado, ao chegar ao poder, um partido político encontra-se "moralmente" obrigado a favorecer aqueles que contribuíram para a sua campanha, permitindo que a adjudicação de obras públicas seja realizada sem real competição, porque sejamos sinceros, Deus livre que uma obra pública seja adjudicada à melhor opção! É um sistema corrupto e viciado.  O melhor exemplo são as PPP, que para mim significam: PURE PRIVATE PROFIT. Traduzindo por miúdos: os privados constroem e exploram uma estrada. Se a estrada não dá lucro o contrato das PPP prevê que o Governo irá canalizar dinheiro dos contribuintes para tornar o investimento, que devia ter risco partilhado, de novo rentável para quem explora o imóvel. 0 risco para o privado, os "Boys", 100% risco para o público. No meio de tudo isto, os alemães, que hoje advogam um sistema de austeridade e controlo das finanças desdobravam-se em contactos pela porta do cavalo para que coisas como o TGV, e os submarinos, fossem adjudicados a empresas alemãs. Desta forma, grandes engenharias iam sempre parar ao estrangeiro. Isto em troca de fundos comunitários e apoios para Portugal. Parece bonito, mas é preciso lembrar que o que os fundos comunitários não pagavam, pagávamos nós, em obras que não tinham real interesse público. Os banqueiros portugueses e também da Europa Central, que se viam protegidos pelo Euro (juros baixíssimos e supostamente muito baixo risco) faziam pressão política para que estes investimentos acontecessem, colhendo, desta forma, a sua parte. Está na panela o suficiente para fazer uma implosão do sistema económico português, causada pela incapacidade do país em pagar aquilo que pediu emprestado. Mas nem só de explicação das causas que deram origem à situação vive o livro. No final surge uma questão muito importante: já estamos assim, como podemos sair? A resposta é muito clara num ponto, e deixa o leitor tomar a sua própria decisão noutro. Primeiro, é extremamente importante reduzir o custo do trabalho português para que os produtos nacionais sejam mais competitivos a nível global. Este ponto é indiscutível. O que é debatível é o seguinte: será que a saída do Euro vai permitir uma recuperação mais rápida de Portugal e colocar-nos no caminho certo? Ou será que é melhor continuar sob esta relativa protecção e esperar por tempos melhores? Em ambos os casos o caminho para a recuperação é árduo e tortuoso, e pode até nem existir uma solução, momento em que o apocalipse económico se abaterá sobre nós tornando-nos na Argentina europeia.

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